segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Programa do Congresso Internacional "A Europa e os Impérios Coloniais dos séculos XVI, XVII e XVIII na Literatura e no Cinema" - Universidade do Algarve/FCHS 20 e 21 de outubro de 2016 (com resumos das comunicações e notas biográficas dos congressistas)





PROGRAMA DO CONGRESSO INTERNACIONAL

A Europa e os Impérios Coloniais dos séculos XVI, XVII e XVIII na Literatura e no Cinema

Universidade do Algarve/FCHS
20 e 21 de outubro de 2016


Auditório Teresa Gamito
9:30| Sessão de Abertura

10:00 | Keynote speaker: (apresentação Jorge Carrega)
Lúcia Nagib (Universidade de Reading/UK): “Antropofagia e intermidialidade: usos da literatura colonial no cinema modernista brasileiro”.
Professora titular de Cinema na Universidade de Reading, onde dirige o Centre for Film Aesthetics and Cultures. É autora dos livros: World Cinema and the Ethics of Realism (Continuum, 2011), A Utopia no Cinema Brasileiro: Matrizes, Nostalgia, Distopias (Cosac Naify, 2006; versão inglesa: Brazil on Screen: Cinema Novo, New Cinema, Utopia, I.B. Tauris, 2007), O Cinema da Retomada: Depoimentos de 90 Cineasatas dos anos 90 (Editora 34, 2002), Nascido das Cinzas: Autor e Sujeito nos Filmes de Oshima (Edusp, 1995), Em Torno da Nouvelle Vague Japonesa (Editora da Unicamp, 1993) e Werner Herzog: O Cinema como Realidade (Estação Liberdade, 1991). É organizadora dos livros: Impure Cinema: Intermedial and Intercultural Approaches to Film (com Anne Jerslev, I.B. Tauris, 2014), Theorizing World Cinema (com Chris Perriam e Rajinder Dudrah, I.B. Tauris, 2011), Realism and the Audiovisual Media (com Cecília Mello, Palgrave, 2009), The New Brazilian Cinema (I.B. Tauris, 2003), Mestre Mizoguchi (Navegar, 1990) e Ozu (Marco Zero, 1990).
RESUMO: Obra maior, mas pouco estudada, do movimento tropicalista do final dos anos 1960, Como era gostoso o meu francês (Nelson Pereira dos Santos, 1970-72) recicla os ideais antropofágicos do modernismo brasileiro dos anos 1920, cuja base se encontra na literatura europeia colonial. O enredo aparentemente linear do filme versa sobre um francês devorado por índios tupis no século XVI, ao estilo do relato autobiográfico do aventureiro Hans Staden que teria escapado por pouco de destino semelhante em viagem ao Brasil. Mas a tessitura do filme é na verdade uma colagem de materiais diversos no melhor estilo tropicalista, incluindo não apenas citações do texto de Staden mas também os desenhos que ilustram a edição de 1557 de seu livro, além de referências aos escritos de Jean de Léry, André Thevet, Nicolas de Villegagnon, José de Anchieta, Manoel da Nóbrega, e a poemas e receitas culinárias do século XVI. Nesta palestra, ireir sugerir que a ausência de hierarquia entre esses materiais, alinhavados por um hibridismo de mídias, línguas e culturas europeias e indígenas, confere ao filme um valor político que transcende o derrotismo reinante na esquerda brasileira naquele momento de auge da ditadura militar. Ao lado de outras obras modernistas associadas ao tropicalismo, como Macunaíma (Joaquim Pedro de Andrade, 1969) e O bandido da luz vermelha (Rogério Sganzerla, 1968), Como era gostoso o meu francês reivindica para o cinema e a arte de seu tempo o direito de pertencer a um mundo multicultural para além dos limites da nação brasileira, provisoriamente em poder de mãos erradas.

11:00 |Pausa para café

11:10| Mesa 1: Painel Temático Intermidialidade e História no Cinema Brasileiro (moderação de Jorge Carrega)
RESUMO: Se é certo que todo filme é um documento sobre sua época, e que todo tratamento da História no cinema implica pensar também na história do cinema, não é menos verdade que neste processo jogam um papel fundamental as distintas formas expressivas com as quais o cinema se relaciona. A intermidialidade aporta, neste sentido, uma perspectiva estimulante: não considerar o cinema como espaço que contém as outras artes, mas como um modo de expressão dialogante que interseciona constantemente com elas. Os momentos intermédios, in-between, são aqueles que interessam. Assim, pensar no cinema como escritura ou revisão da História implica pensar, também, na dimensão histórica das obras pictóricas, das peças teatrais ou das composições musicais com as quais interaciona. Escrever História com o cinema é pensar na história do cinema, mas também na história destas artes, e na história dos seus cruzamentos com as imagens em movimento.
Neste painel queremos discutir esta dimensão historiográfica mestiça, cruzada, intermidiática, na qual não se trata apenas do entrelaçamento entre cinema da história e história do cinema, mas também de uma interseção com a história das cores, a história da música (desde a noção de tropicalismo) e a história das canções. Trata-se de múltiplas histórias entre mídias que desvelam, com uma força incontestável, as numerosas camadas expressivas que toda escritura da História implica.

Stefan Solomon (University of Reading): “Colour Cinema, Colour-Time: From Oiticica to Glauber”.
Stefan Solomon é pesquisador pós-doutoral em Cinema na University of Reading, vinculado ao projeto ‘Towards an Intermedial History of Brazilian Cinema: Exploring Intermediality as a Historiographic Method’ (IntermIdia), financiado pela AHRC e a FAPESP. Atualmente está analisando a interação entre o cinema e as artes visuais nos filmes associados ao movimento da Tropicália, assim como estudando projetos experimentais contemporâneos no cinema brasileiro. Stefan também mantém um interesse no trabalho de William Faulkner, e recentemente completou uma monografia sobre sua trajetória como roteirista em Hollywood.

RESUMO: In 1969, when shooting O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro (Antonio das Mortes), Glauber Rocha turned to colour film. Although it wasn’t the first time he’d worked with colour, here Glauber made special use of Eastmancolor technology in bringing to life characters from Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) that had previously appeared only in black and white. While the choice to switch film stock was in part motivated by a desire for Brazilian films to compete with foreign productions, Glauber also pointed to the similarities between film and painting, and professed an interest in the ‘visual integration of colour with music and dance.’

 

The intermedial comparison that Glauber offers is an intriguing one, especially considering the ways in which, at precisely the same time, visual artists in Brazil were following a different trajectory where colour was concerned. As Jacques Aumont has observed, the 1960s was a period in which cinema was struggling to achieve accurate colour representation, while painting was turning to non-representational, abstract uses of colour. In Brazil, this was particularly apparent in the work of Hélio Oiticica, then working on his philosophy of cor-tempo (colour time), but who would also go on to make and appear in several films, culminating in his Cosmococas with Neville D’Almeida.
Following recent work on intermediality and colour by Sarah Street and Joshua Yumibe, in this paper I will consider the points at which the colour paths of cinema and the visual arts crossed in Brazil. In particular, I will analyse Oiticica’s ideas about colour in its pigmentary, elemental forms, and will suggest that his notion of cor-tempo manifests in a very literal way in cinema, where colour moves through time.

Samuel Paiva (Universidade Federal de São Carlos): “Confronto de Tropicalismos e Intermidialidade no Cinema de Pernambuco”.
Samuel Paiva é professor de História e Teoria do Cinema vinculado ao Departamento de Artes de Comunicação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). É autor de várias publicações, entre outras, A figura de Orson Welles no cinema de Rogério Sganzerla (2016) e coeditor do livro Viagem ao cinema silencioso do Brasil (2011).
RESUMO: Esta comunicação procura debater a maneira como o cinema produzido no estado de Pernambuco, no Brasil, nos anos 1990, está atravessado polemicamente por referências relacionadas a distintas noções de Tropicalismo. A ideia é investigar como, de um lado, esse cinema confronta concepções do “Luso-tropicalismo” de Gilberto Freyre, que por sua vez repercutiu na perspectiva do “Movimento Armorial” proposto por Ariano Suassuna nos anos 1970, com sua defesa de uma essência mítica, nacional e popular, vinculada a tradições coloniais do Nordeste brasileiro. Por outro lado, há o interesse no “Tropicalismo” proposto, nos anos 1960, por artistas tais como, entre outros, Hélio Oiticica (nas artes plásticas), Caetano Veloso e Gilberto Gil (na música), Zé Celso Martinez Corrêa (no teatro), Glauber Rocha e Rogério Sganzerla (no cinema), que retomam concepções de Oswald de Andrade e seu “Manifesto Antropófago” (1928), voltado a uma releitura crítica do passado colonial do Brasil, a partir da perspectiva de uma “antropofagia cultural”. Estas distintas noções de Tropicalismo estão em confronto em Pernambuco nos anos 1990, quando ocorre a “retomada” do cinema pernambucano em consonância com a eclosão do movimento Manguebeat. A hipótese a ser discutida na comunicação é que, nesse confronto, a Intermidialidade se constitui como um método capaz de relacionar criticamente a relação do cinema com outras mídias e com a História. Nesse sentido, será observada especialmente a figura do “estrangeiro” na tensão com o “nacional” a partir das relações entre cinema e música, observando-se especialmente o curta metragem Maracatu, maracatus (Marcelo Gomes, 1995), entre outras produções de filmes pernambucanos do referido período.


Albert Elduque (University of Reading): A canção filmada como relato histórico”.
Albert Elduque é pesquisador pós-doutoral na University of Reading, onde faz parte do projeto ‘Towards an Intermedial History of Brazilian Cinema: Exploring Intermediality as a Historiographic Method’ (IntermIdia). Neste projeto investiga os vínculos entre cinema e música no cinema brasileiro, especialmente no cinema experimental e nos documentários contemporâneos sobre música. Sua tese doutoral (Universitat Pompeu Fabra, 2014) esteve focalizada nos conceitos de fome, consumo e vômito no cinema moderno europeu e brasileiro. Atualmente é coeditor da revista acadêmica Cinema Comparat/ive Cinema, editada pela Universitat Pompeu Fabra.
RESUMO: Por causa do vínculo inextricável entre música e identidade nacional, os documentários sobre música do Brasil possuem uma forte dimensão histórica, formada por múltiplas camadas temporais que criam curtos-circuitos entre passado e presente e constroem, assim, uma história própria. Nesta comunicação queremos fazer uma aproximação geral aos vínculos entre música brasileira e história nacional partindo do filme Cartola – Música para os Olhos (2007), de Lírio Ferreira e Hilton Lacerda, que usa as canções para narrar tanto a vida do cantor como os acontecimentos do Brasil, entrelaçando assim uma história pessoal e uma história coletiva. Interessa-nos analisar este vínculo, assim como as duas formas que nele tomam as canções: uma usa as imagens e as gravações de arquivo para montar as canções, com a proliferação visual de materiais prévios; a outra mostra cantores que interpretam as letras de Cartola, e a canção é, simplesmente, filmada. Cria-se assim um cruzamento entre duas tendências do documentário musical brasileiro, ambas com uma evidente dimensão histórica. Assim, por um lado existe uma linha que reinterpreta as imagens de arquivo com as canções, uma revisão que vai além da funcionalidade e chega a limites experimentais, como aqueles atingidos por Rogério Sganzerla em Isto é Noel Rosa (1990) ou Júlio Bressane nas ficções ensaísticas Tabu (1982) e O Mandarim (1995). Pelo outro, em muitos dos documentários os cantores interpretam canções de músicos que admiram, estabelecendo assim a escritura de histórias geracionais sem precisar de outras imagens, numa linha fértil que desemboca na intimidade vocal das estrelas (Maria Bethânia, Pedrinha de Aruanda [2007], de Andrucha Waddington) ou na radiografia social e cultural do povo (As canções [2011], de Eduardo Coutinho). Cartola – Música para os Olhos é um cruzamento entre ambas as linhas e serve como ponto de partida para se aproximar a elas. Em todos os casos, seja com a erupção visual ou com a austeridade da voz, a História desenha-se através das canções filmadas.


12:20| Comunicação por convite: (apresentação de Sandra Boto)
Mirian Tavares (FCHS/CIAC): “O Processo do Rei – a História revisitada”.

Professora Associada da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universi­dade do Algarve. Com formação académica nas Ciências da Comunicação, Se­miótica e Estudos Culturais (doutorou-se em Comunicação e Cultura Contempo­râneas, na Universidade Federal da Bahia), tem desenvolvido o seu trabalho de investigação e de produção teórica em domínios relacionados com o cinema, a literatura e outras artes, bem como nas áreas de estética fílmica e artística. É, atualmente, diretora da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais e Coordenado­ra do CIAC, Centro de Investigação em Artes e Comunicação.

RESUMO: Nesta comunicação vou analisar o filme O Processo do Rei (1989), de João Mário Grilo. Baseado no processo contra D. Afonso VI, o realizador conseguiu ser fiel ao tempo histórico – século XVII -, mas também profundamente contemporâneo, explorando aspectos eternos e cíclicos da própria História. O cinema, neste filme, funciona como um palco onde a História revela a cenografia que os livros costumam ocultar. Para a profundar esta questão começo por discutir as relações entro o cinema e o teatro a partir do conceito de mise en scéne. O que aproxima e distancia estas duas formas artísticas? De que maneira o cinema, ao longo da sua história, construiu a sua própria mise en scéne recorrendo, sobretudo, à montagem?

13:00- Pausa para almoço

14:30 | Keynote speaker (apresentação de Sara Fernandez)
Miguel Real (CLEPUL): “O Romance Histórico Português. Do romantismo ao século XXI".
Professor de Filosofia no Ensino Secundário e especialista em Cultura Portuguesa, possui uma vasta obra dividida entre o ensaio, a ficção e o drama, tendo recebido o Prémio de Revelação nas áreas da Ficção e do Ensaio Literário da Associação Portuguesa de Escritores, o Prémio Ler/Círculo de Leitores, o Prémio da Associação dos Críticos Literários, o Prémio Fernando Namora da Sociedade Estoril-Sol e finalista do Prémio de Romance e Novela da APE, e do Prémio SPA Autores.
Investigador do CLEPUL – Centro de Literaturas e Culturas Europeias e Lusófonas, Miguel Real tem publicado diversos ensaios sobre temas relativos à cultura portuguesa. Da sua vasta bibliografia destacamos alguns títulos essenciais para uma melhor compreensão da cultura e literatura portuguesas dos últimos dois séculos:
- Geração de 90: Romance e Sociedade no Portugal Contemporâneo (Campo das Letras, 2001)
- O Pensamento Português Contemporâneo 1890-2010 - O Labirinto da Razão e a Fome de Deus (INCM, 2011)
- Introdução à cultura portuguesa: Séculos XIII a XIX pref. Guilherme d'Oliveira Martins (Planeta, 2011)
- O Romance Português Contemporâneo: 1950-2010 (Editorial Caminho, 2012)
- Portugal: Um País Parado no meio do Caminho (2000-2015) (Dom Quixote, 2015)



15:30 | Mesa 2 (moderação de Mirian Tavares)
Ana Alexandra Carvalho (FCHS/Clepul): “Mariana Alcoforado, personagem histórica, mítica e romanesca”.
Doutorada em Literatura Francesa, Professora da UAlg, Investigadora do CLEPUL e colaboradora do CIAC. Trabalha nas áreas das Literaturas e Cul­turas Francesa e Comparada, Estudos Literários, Estudos de Tradução, His­tória da Leitura e Estudos sobre o Fantástico e a Ficção Científica. Tem nu­merosas publicações dispersas em revistas e atas, bem como vários livros: O Jogo do Desejo em Claude Crébillon (2003); Aventuras d’Escrita(s) (2004, coautoria); Retóricas (2005, cocoord.); Viagens sentimentais pelo País da Literatura (2005); Outras Retóricas (2006, cocoord.); Ensaios & Outros Es­critos (2008, coautoria); O Jogo no Jogo (ed. 2008); O Silfo (2008, tradução).

Carina Infante do Carmo (FCHS/Centro de Estudos Comparatistas da F.L.U.L): “Voltar à Guerra da Restauração e contá-la de outra maneira”.
Professora Auxiliar da Universidade do Algarve. Membro do Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Publicou Adolescer em Clausura. Olhares de Aquilino, Régio e Vergílio Ferreira sobre o Romance de Internato (1998), A Militância Melancólica ou a Figura de Autor em José Gomes Ferreira (2010), e co-organizou com Paula Morão Escrever a Vida - Verdade e Ficção (2008); com Violante Magalhães os nºs. 6 e 7 da revista Nova Síntese sobre Manuel da Fonseca (2011) e Alves Redol (2012). Tem artigos publicados em periódicos e outras edições sobre literatura portuguesa moderna e contemporânea, sobretudo sobre neo-realismo e literatura autobiográfica.
RESUMO: Uma cidade sitiada e ocupada pelo exército espanhol, num dos momentos mais decisivos da Guerra da Restauração, a Batalha do Ameixial (1663), faz de Évora e os Dias da Guerra (1991), de Mário Ventura, um dos romances mais relevantes (e esquecidos) do pós-25 de Abril. Integra a vaga romanesca dos anos 1980-1990 que entre nós reviu a memória colectiva portuguesa e dialogou com esse novo tempo democrático, entretecendo a factualidade histórica nas malhas da ficção e na consciência auto-reflexiva da escrita literária. Aqui estamos longe da heroicização e manipulação autolegitimadora com que o salazarismo reconstruiu aquele período crítico e árduo de restauração da independência nacional. Évora e os Dias da Guerra apresenta não apenas a luta desesperada de ambos os lados da contenda mas também a relatividade das versões da História e a impossibilidade de recuperar o passado tal como foi, o que beneficia o sentido não contraditório de historicidade e intemporalidade das personagens. O testemunho do narrador e protagonista introverte a realidade representada e inscreve a sua humanidade confusa e tensa num impressionante fresco colectivo. O entrecho do romance, entretecido por cartas e registos pessoais do eu-narrador, tornam a sua narração num acto contínuo de autojustificação e de luta pela sobrevivência perante o futuro; para lá da sua circunstância clandestina, angustiada e dúbia de cronista-espião, impossibilitado de se explicar perante os contemporâneos.

J.J. Dias Marques (FCHS): “Oscar Wilde Detetive: os Romances Policiais-históricos-queer de Gyles Brandreth”.
J. J. Dias Marques é doutorado em Literatura Oral pela Universidade do Algarve, onde é professor auxiliar.
Desde 1980, tem-se dedicado à recolha e estudo da literatura oral portuguesa, nomeadamente do romanceiro. Sobre este género publicou numerosos artigos e a ele dedicou a sua tese de doutoramento (A Génese do Romanceiro do Algarve de Estácio da Veiga, 2002). Nos últimos anos, tem-se dedicado também ao estudo de outros géneros orais, nomeadamente das lendas.
É coordenador do Centro de Estudos Ataíde Oliveira e diretor da revista Estudos de Literatura Oral. É, por eleição, membro associado da Folklore Fellows Network.
É um grande apreciador da literatura policial.

RESUMO: A minha comunicação debruçar-se-á sobre a série de romances intitulada “Oscar Wilde Murder Mysteries”, de Gyles Brandreth. Trata-se de seis romances publicados entre 2007 e 2012, que têm como personagem principal Oscar Wilde e se passam em finais do séc. XIX.
Partindo sobretudo da análise do primeiro e do último romances da série (Oscar Wilde and the Candlelight Murders e Oscar Wilde and the Murders at Reading Gaol), tentarei mostrar como os “Oscar Wilde Murder Mysteries” pertencem ao subgénero do romance policial e, ao mesmo tempo, ao subgénero do romance histórico. Referirei também os aspetos de temática queer presentes nestas obras.


16:40- Pausa para café

16:50 – Mesa 3 (moderação de Ana Soares)
Sara Vitorino Fernandez (Clepul): “Plus Ultra: o retrato de Carlos V e dos Habsburgos no romance A Senhora, de Catherine Clément”.
Doutorada em Literatura, nas áreas do Pós-Modernismo e Metaficção na Li­teratura Portuguesa Contemporânea, pela Universidade do Algarve (2014), Mestre em Literatura Comparada (UAlg/2005) e Licenciada em Estudos Portugueses – Ramo Científico, com especialização nas áreas de Literatura Comparada e Cultura Medieval (UAlg/2002). É investigadora do CLEPUL, tendo publicado vários artigos em revistas e volumes de atas. Possui uma coluna permanente na revista suíça Lusi­tania Contact denominada “Escritores Portugueses”, onde escreve sobre temas e autores da Literatura Portuguesa.
RESUMO: As figuras históricas do Imperador Carlos V, de Maria da Hungria e do Arquiduque Maximiliano de Habsburgo são caracterizadas pelos historiadores como personagens dotadas de grande gravidade e de de suma importância para a História Universal. No entanto, e através da ficção narrativa, Catherine Clément, no romance A Senhora (1992), essas mesmas personagens adquirem uma dimensão emotiva e humana. À luz da teoria do Novo Romance Histórico e da Metaficção Historiográfica trataremos de analisar de que forma as figuras históricas descem do seu pedestal político, histórico e social para ganharem uma densidade psicológica diferente, acusando emoções, medos ou questões que não conseguimos filtrar através dos livros de História.

Gaia Bertoneri (Universidade de Génova / Universidade de Turim)
“O cinema na literatura: para uma crítica visual da obra literária de Ana Teresa Pereira”.
Doutoranda em Digital Humanities (Universida de Génova e Turim), ocupa-se da aplicação do conceito de visual studies à literatura portuguesa contemporânea e em particular à obra da autora Ana Teresa Pereira. Em 2013 concluiu o mestrado em Tradução com a tese Trabalhar no escuro: tradurre Ana Teresa Pereira. Ensina desde o ano lectivo de 2014/2015 Língua portuguesa no curso de “Scienze della Mediazione Linguistica” no departamento de línguas e literaturas estrangeiras e culturas modernas da Universidade de Turim. É membro na qualidade de “jovem investigadora” do Centro de Investigação CLEPUL/Universidade da Madeira. Faz parte do comité de redacção da revista luso-italiana de estudos comparados Submarino e colabora com a revista online RiCognizioni. Traduziu para italiano os romances La regina Ginga (2016, no prelo) de José Eduardo Agualusa, L’estate selvaggia dei tuoi occhi (2015) de Ana Teresa Pereira bem como os contos “Uns braços”, “Cantiga de esponsais” e “Trio em lá menor” de Joaquim Maria Machado de Assis para a antologia Galleria Postuma e altri racconti (2016, no prelo) e vários contos das antologias do conto português contemporâneo Bestiario Lusitano (2014) e 12 Mesi a Funchal (2008).
RESUMO: Ao aplicar os visual studies à obra de Ana Teresa Pereira, pretende-se analisar a ontologia da personagem a partir do dispositivo cinematográfico global. Como no estudo da arte pictórica, podemos recorrer à técnica do reflectograma infravermelho para descobrir as figuras reflectidas nas personagens pereirianas: A. Hepburn, J. Fontaine, K. Novak.

Maira Zénun (Universidade Federal de Goiás): “Idrissa Ouedraogo – um contador de histórias de outros tempos”.
Entre 2001 e 2004, cursou bacharelado em Ciências Sociais, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em 2005, ingressou no Mestrado em Sociologia, pela Universidade de Brasília (UnB), com a dissertação “Os intelectuais na terra de Vera Cruz: cinema, identidade e modernidade”. Desde 2007, mantém trabalho autoral, com imagens e textos poéticos, exposto em coleção privada, publicações impressas e blogs virtuais. Entre 2007 e 2014, lecionou Sociologia para o Ensino Médio, e Antropologia e Sociologia para o Ensino Superior, no Distrito Federal/Brasil. Em 2014, ingressou no curso de Doutorado em Sociologia, pela Universidade Federal de Goiás (UFG), sob a orientação do Prof. Dr. Manuel Ferreira Filho, como bolsista CAPES. Deste então, desenvolve projeto de pesquisa que aborda a discussão sobre imagens produzidas a partir de uma estética de autorrepresentação de culturas negras africanas. Em 2015, realizou com a Profa. Dra. Catarina Alves Costa, estágio pelo Programa Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE/CAPES), vinculada ao Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA), na UNL. Entre 2010 e 2015, participou como investigadora e produtora de imagens, do TRANSE/UnB - Núcleo Transdisciplinar de Estudos sobre a Performance. E desde 2014, colabora com o FICINE - Fórum Itinerante de Cinema Negro. Ambos grupos de pesquisa vinculados ao Conselho Nacional Científico e tecnológico (CNPQ), no Brasil. Possui publicações e participação em eventos nas áreas de Ciências Sociais/Humanas, Artes Visuais, Cinema, Fotografia e Performance."

RESUMO: Durante os séculos XVI, XVII e XVII, alguns países da Europa, entre eles Portugal, foram responsáveis por implementar o colonialismo em grande parte do continente africano. Como não poderia deixar de ser, e escorada na versão única da História da Humanidade, escrita sob os alicerces teórico-metodológicos da colonialidade, a literatura moderna pouco nos conta sobre como era a realidade das sociedades africanas, antes e ao longo do processo colonial – cenário que também é de muita luta e resistência. Entretanto, sobre essa questão, parece bastante interessante como o cinema tem corrigido este enorme equívoco, nos contando aos poucos, alguns detalhes sobre esse vasto período histórico, retratando outras formas de organização social e práticas de grupos que não existem hoje em dia. Deste modo, para este paper, trago a baila, uma leitura sociológica sobre dois dos filmes dirigidos por Idrissa Ouedraogo, onde o cineasta reescreve o passado, cria novas imagens e se torna também um historiador. Trata-se, no caso, de um importante realizador burquinabé, ganhador de muitos prêmios em eventos africanos e europeus. Dentre eles, o Prix Étalon de Yennenga do FESPACO – Festival Pan-Africano de Cinema e Televisão de Ouagadougou. Maior e mais antigo ritual africano que celebra o cinema como uma importante forma de auto afirmação identitária, inaugurado logo após as lutas anti coloniais. São eles, Yaaba (Grandmother), de 1989, que narra episódios sobre a relação entre uma criança e uma ansiã. E Tilaï (The Law), de 1990. Sobre um truncado caso de amor, impossibilitado de se realizar, em função de questões que relacionam as normas às formas de parentesco. Ambas obras de arte produzidas sobre histórias universais, apesar de essencialmente africanas e desatreladas dos problemas gerados pelo colonialismo. Capazes de nos remeter a um tempo anterior, deslocado da conflituosa relação entre a Europa e a África, entre os séculos XVI e XVIII. Idrissa Ouedraogo é aquele tipo de cineasta que conseguiu trazer para as telas, recordações de uma espécie de educação noturna, a qual teve acesso quando era criança. Transformando os seus filmes em instrumento pedagógico no ensino da História Mundial.

17: 50 | Comunicação por convite (apresentação Ana Carvalho)
Ana Isabel Soares (FCHS/CIAC): “Tempo de contar: Calendários, almanaques e o romance inglês".
Doutorada em Teoria da Literatura pela Universidade de Lisboa (2003) e Professora na Universidade do Algarve desde 1996, tem tido a seu cargo, ao longo dos anos, disciplinas das áreas de História do Cinema, Teoria da Imagem, Estudos Culturais, Literatura e Cinema, e, quase ininterruptamente, Literatura Inglesa. Desenvolveu pós-doutoramento no Programa em Teoria da Literatura da Faculdade de Letras de Lisboa, como bolseira da FCT (2009 e 2010). É membro integrado do CIAC. Tem publicado artigos e orientado seminários em várias universidades, nacionais e internacionais, sobre cinema, nomeadamente português. É membro fundador e foi a primeira presidente da AIM - Associação de Investigadores da Imagem em Movimento. Desempenhou funções no Ministério da Educação e Ciência (2011-2012) e no Camões - Instituto de Cooperação e da Língua (2013-2014). Traduziu, com Merja de Mattos-Parreira, a epopeia finlandesa, Kalevala (ed. Dom Quixote, 2013) e tem publicado outras traduções literárias, de autores estrangeiros para língua portuguesa e nacionais para língua inglesa.
RESUMO: Os séculos XVI e XVII são férteis em alterações, algumas de grande brusquidão, na sociedade inglesa. Após o fim da era isabelina, o aparente recuo de medidas que restringiram, por exemplo, o furor da criatividade teatral, pode entender-se no seu reverso: a dinâmica de viagens e de novos conhecimentos científicos fazia exigir nomenclaturas inusitadas e, acima de tudo, a invenção de narrativas. A arte literária - acostumada ao lirismo até quando este, acusado de falsaria e artificialismo, se revoltava - renegava a prosa, relegava-a para os cronistas e legisladores. Os quotidianos, porém, avolumavam-se em surpresas e chamavam um tempo menos contado, em que as síncopes dos versos cedessem a fronteira da página e a prosa adentrasse, por fim, o reino altaneiro da poesia.


18:30 - Encerramento 1º dia



2º dia (Auditório Teresa Gamito)

9:30 |Abertura
9:35 | Mesa 4 (moderação de Bruno Silva)
Natália Laranjinha (CIAC):A abordagem fílmica da Controvérsia de Valladolid”.
Natália Laranjinha é licenciada em Filosofia pela Universidade Nova de Lisboa e em Línguas e Literaturas modernas – variante português/francês; Mestre em Literatura Francesa e Doutorada em Literatura Comparada pela Universidade de Lisboa. Terminou em 2015 um pós-doutoramento em cinema na Universidade de Nova Iorque e CIAC com um projeto intitulado Pathos e superfícies em Lars von Trier. Foi docente do Instituto Superior Dom Afonso III, diretora do curso em Línguas e Assessoria de Gestão, do centro de línguas e fundadora da revista Inter-artes. E autora de vários artigos sobre literatura e cinema. Os seus interesses centram-se nas questões da representação não mimética, nas figuras do fracasso e nas emoções.
RESUMO: Em 1550, o rei de Espanha Carlos V convoca um debate no Colégio de São Gregório, em Valladolid, para debater o estatuto dos Índios do Novo Mundo. Perante um júri, dois intelectuais foram convocados para esta discussão: Juan Ginés de Sepúlveda e Bartolomeu de Las Casas. O tema principal poderá resumir-se as seguintes questões: os Índios são seres livres ou escravos naturais? Os Índios têm alma? A controvérsia de Valladolid foi o primeiro debate, na história europeia, sobre os direitos dos povos colonizados e teria repercussões importantes do ponto vista antropológico e do direito humano.
O debate tece-se entre os dois adversários, o dominicano Las Casa, defensor dos Índios e o teólogo Sepúlveda que defende a escravização dos Índios. A argumentação de Sepúlveda apoia-se na filosofia de São Tomas de Aquino e na de Aristóteles, principalmente, na sua análise da escravidão exposta na Politica. Em oposição, Las Casas apresenta uma contra-argumentação baseada em postulados humanistas e argumentos do direito natural. O debate condensa-se num exercício retórico, constituído por silogismos, onde questões tais como a legitimidade (ou não) da guerra, a relação com o Outro (e as suas diferenças), a barbárie e a evangelização são abordadas.
Em 1992, estreia um filme francês de Jean-Daniel Verhaeghe (La controverse de Valladolid), o argumento foi escrito em peça de teatro por J.C. Carriere e o romance histórico do mesmo autor seria publicado igualmente em 1992. O filme pretende dar a conhecer ao grande público um debate histórico fundamental, ao fazer reviver as mentalidades da época e as tensões do debate. No entanto, o cineasta adapta a realidade histórica à linguagem cinematográfica, alterando e reajustando alguns factos históricos. De igual modo, a representação do Imperio colonial, através da filmagem de um debate, obrigou o cineasta a reduzir drasticamente as cenas exteriores, de forma a concentrar-se nos argumentos e nas emoções das personagens.
Propõe-se uma análise do filme na sua relação com a verdade histórica, os recursos escolhidos pelo cineasta para representar no cinema um debate e as questões antropológicas e teológicas discutidas e, por fim, as consequências surpreendentes do debate na Europa do sec. XVI.


William Pianco (CIAC): A Alegoria Histórica em Cristovão Colombo- O Enigma, de Manoel de Oliveira.
Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES (Brasil) – pelo Programa de Doutorado Pleno no Exterior. Doutorando em Comunicação, Cultura e Artes pela Universidade do Algarve, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais / Centro de Investigação em Artes e Comunicação. Mestre em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos (Brasil, 2011). Graduado em Comunicação Social pela Universidade Cruzeiro do Sul (Brasil, 2006). É autor de diversos artigos, capítulos de livros e comunicações em veículos especializados e em congressos das áreas do Cinema e do Audiovisual. Membro da Associação dos Investigadores da Imagem em Movimento – AIM. Membro do Grupo de Estudos Sobre História e Teoria das Mídias – Cinemídia (Brasil). Seu campo de investigação está concentrado no cinema português, com ênfase na obra de Manoel de Oliveira. 

RESUMO: Seja com o projeto expansionista português, passando pelo fracasso de Alcácer-Quibir (Non, ou a vã glória de mandar, 1990), partindo da coroa dual na Península Ibérica (O sapato de cetim, 1985) até o processo da Restauração da monarquia em Portugal (Palavra e utopia, 2000), ou mesmo indagando os motivos que inspiraram o rei Dom Sebastião à malfadada luta contra os mouros em África (O Quinto-Império, ontem como hoje, 2004), os séculos XVI e XVII, de fato, são da predileção de Manoel de Oliveira quando o seu cinema busca refletir a história nacional.

No entanto, se os exemplos acima enquadram-se dentro dos chamados “filmes de época”, há ainda o estimulante caso de Cristóvão Colombo – o enigma (2007), que, por meio da investigação científica de seu protagonista, remete a episódios históricos para debater a condição geopolítica de Portugal no contemporâneo. Ou seja, com o título em questão, Oliveira assume como método de reflexão o olhar para o passado como maneira de lançar luzes sobre o presente.

Cristóvão Colombo – o enigma conta a história de Manuel Luciano, que, nascido em Portugal, migra para os Estados Unidos ainda jovem, retorna à terra natal para formar-se em medicina e, paralelamente à esta profissão, dar sequência à investigação que é tema de uma pesquisa que ele empreende ao longo da vida: comprovar que Cristóvão Colombo era português.

De forma sintética, pode-se afirmar que o filme tem como objetivo último debater a nacionalidade de Colombo (como português, no caso) de modo a sugerir o desejo de reafirmar Portugal como o “descobridor” de todos os continentes do mundo: a figura do navegador como fundador da América do Norte conota implicações de Portugal como precursor de um poderio contemporâneo – os Estados Unidos.

Dessa maneira, com esta comunicação pretendo debater e apresentar elementos que demonstrem como Manoel de Oliveira utiliza a Alegoria Histórica, no filme em questão, como estratégia retórica na avaliação da relevância de Portugal para a história mundial, com ênfase no Ocidente, dentro de um processo iniciado nos finais do século XV, mas que conhecerá suas consequências nos períodos subsequentes.

Jorge Carrega (CIAC): “Romance Histórico e Cinema Transnacional na Europa Mediterrânea: Alexandre Dumas e o filme de cape et d'épée”.

Doutor em Comunicação, Cultura e Artes e Mestre em Literatura Compara­da pela Universidade do Algarve. Investigador do CIAC-Centro de Investiga­ção em Artes e Comunicação. Lecionou as disciplinas de História do Cinema, Cinema e outras Artes (UAlg), História e Cultura Portuguesa e Recursos Cul­turais (INUAF). Organizou várias exposições e conferências sobre cinema e publicou diversos livros e artigos em revistas académicas, destacando-se Elvis Presley e o Cinema Musical de Hollywood (2009), O Euro-Western: uma visão europeia do mais americano dos géneros cinematográficos (2014), Orson Welles y el cine de Hollywood en la década de 1940 (2015) e O Ci­nema de Ray Harryhausen: efeitos especiais e maneirismo no cinema de Hollywood (2016).
RESUMO: A emergência da imprensa de massas, em meados do século XIX, permitiu que autores como Alexandre Dumas e Paul Féval conquistassem um vastíssimo número de leitores em toda a Europa ocidental. Influenciado por Walter Scott, Dumas assinou uma serie de romances históricos de aventuras que mereceram mais de uma centena de adaptações cinematográficas, dando origem ao chamado filme de cape et d’epeé. Esta comunicação procura analisar a influência do romance histórico de aventuras e, em particular a obra de Alexandre Dumas, no desenvolvimento do cinema trasnacional da Europa mediterrânea.


10:45 | Pausa para café

11:00 | Mesa 5 (moderação de Adriana Nogueira)
Marisa Mourinha (Università degli Studi di Perugia: “Paraísos perdidos: do Tabu de Murnau ao Tabu de Miguel Gomes”
Marisa Mourinha nasceu em Lisboa, onde se licenciou em Filosofia na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo-se especializado nas áreas da Estética e da Filosofia Portuguesa. Mais tarde, na mesma instituição, concluiu a pós-graduação no Programa de Literatura Comparada, preparando agora um Doutoramento no mesmo programa, com um projecto sobre a tradução de António Lobo Antunes. Desde setembro de 2011, é leitora de português na Università degli Studi di Perugia.
RESUMO: Nos últimos anos, têm vindo a público em Portugal obras de ficção que convidam a um novo olhar sobre o período colonial, como foi o caso do Caderno de Memórias Coloniais de Isabela Figueiredo ou do romance O Retorno, de Dulce Maria Cardoso. Em 2012 sai Tabu, de Miguel Gomes. Filmado a cores e a preto e branco, foi um sucesso de público desde o início, e foi considerado um dos dez melhores filmes do ano pelos Cahiers du Cinéma.
A história de amor de dois jovens é o pretexto para uma incursão na África colonial portuguesa. Constituído por duas partes distintas, uma no presente e outra num longo flashback para a época em que os amantes, agora velhos, se conheceram, Tabu joga com a memória e a nostalgia, com um olhar crítico, sublinhado pela ironia.
Numa clara referência ao clássico de Murnau com o mesmo nome, Miguel Gomes convida-nos a considerar a crueldade latente no paraíso perdido do império colonial, evocando aqueles que outrora foram os clichés de um género, agora completamente ultrapassado, o da nostalgia de uma África colonizada. A uma primeira parte sonora, passada na moderna Lisboa, segue-se uma segunda parte muda, narrada em off, e filmada a preto e branco num Moçambique colonial e idílico, onde desfilam, privados do som, os colonos brancos e os respectivos mundos.
Embora o realizador declare em entrevistas que o paraíso perdido é a juventude, Tabu deixa espaço para uma leitura pós-colonial, sobretudo se tivermos em conta o diálogo que estabelece com a obra de Murnau, um filme de 1931 (cujo subtítulo é “Uma história dos mares do sul”) em que o realizador nos apresenta a sua própria visão nostálgica de paraísos perdidos – mas ao contrário: o filme de Murnau é uma elegia ao bom selvagem, e uma reflexão sobre o choque de civilizações.

Liliana Lopes Dias (CIAC): The Articulation of Early Modern English and Scottish Queenship on Film”.
Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas-Estudos Portugueses e Ingleses e em Línguas, Literaturas e Culturas-Ramo de Português e Espanhol. Especiali­zada em Literatura Comparada na área de Literatura e Cinema. Doutoranda em Comunicação, Cultura e Artes. Colaboradora do CIAC-Centro de Investigação em Artes e Comunicação da Universidade do Algarve. Publicou artigos em re­vistas, livros e outras publicações científicas.
RESUMO: Cinema seems to struggle with a balanced idealisation of queenship. Queens are frequently represented either too strong or too weak, cold-hearted and vile or exaggeratedly good and emotive. Strong presentations of female power may lead to loss of humanity. Another side effect of strong representations is the loss of femininity, sometimes making a royal character grotesque. Weak representations of queenship, that is emotive depictions, make them failures as queens. Emotions, or rather passions, makes these women bad and weak rulers, however makes them worthy of empathy from the audience.
The representations of Elizabeth I, Mary of Scotland and Mary Tudor confirm that pattern. Mary Tudor never receives a kind characterisation. When she appears at all in film is to be pictured in an unsympathetic way. She is presented as a Catholic zealot, a maniac, delusional, physically and psychologically ill. Mary Stuart is always moved by passions and reckless behaviours, and, even though sometimes her actions are criminal, she is always a martyr, a woman full of idiosyncrasies and hardly a villain. Elizabeth, on the other hand, is a more complex matter. She may be the victim or the executioner and frequently both; she can be good and/or bad; she can be emotional or driven by passions, and both. Her character is always full of shades and contrasts.
Moreover, when these queens are juxtaposed, their representations tend to be polarised. Mary Tudor only seems to be interesting in contrast with Elizabeth and is presented as the zealot and delusional villain. Mary Stuart tends to be the martyr and Elizabeth, by comparison, the conniving and jealous executioner. Represented alone Elizabeth’s characterisation can be more balanced and positive, thought she may have elements of villainy or be the agent that prevents other people from being happy. In the case of Elizabeth, balance tends to occur when the film focuses on the ‘body politic' and the historical persona. However, focusing on the ‘body politic’, in detriment of the ‘body natural’, may have a dehumanising, villainising or sometimes slightly masculinising effect.


11:50| Comunicação por convite: (apresentação de Adriana Nogueira)
João Carlos Carvalho (FCHS/Clepul): “Crítica Literária e Romance Histórico: a propósito de Camões – este meu duro génio de vinganças, de Maria Vitalina Leal de Matos”.

Professor da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade do Algarve. Investigador integrado no CLEPUL e Colaborador do CIAC. É Dou­torado em Literatura Portuguesa Clássica pela Universidade do Algarve (2000), Mestre em Literatura Portuguesa pela Faculdade de Letras da Uni­versidade de Lisboa (1990) e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas por esta última Universidade (1985). É autor de vários livros, capítulos de livros e outras publicações científicas, destacando-se títulos como Ciência e Alteridade na Literatura de Viagens. Estudo de Processos Retóricos e Her­menêuticos, 2003; Ensaios & Outros Escritos, 2008 (em co-autoria); Viajan­tes, Escritores e Poetas: Retratos do Algarve, 2009 (em co-coordenação); A República – Figuras, Escritas e Perspectivas, 2011 (coordenação); A Pere­grinação de Fernão Mendes Pinto e a Perenidade da Literatura de Viagens, E-Book, 2015 (coordenação).

12:45 | Pausa para almoço

14:30| Abertura
14:35-15:45| Mesa 6 (moderação de Sandra Boto)
Isa Ferreira Lima (Universidade Estadual de Santa Cruz): “POR UM CINEMA DESCOLONIAL – pensar o imperialismo cultural a partir da "Eztetyka da fome" de Glauber Rocha”.
Graduada em Cinema e Audiovisual pela UESB de Vitória da Conquista no ano de 2015, pós-graduanda do mestrado em Letras: Linguagens e Representações da UESC. Tendo passado por diversos campos durante a graduação, hoje desenvolve pesquisa dentro da relação cinema e literatura, orientada pela Profa. Dra. Paula Regina Siega, trabalhando em especial com recepção crítica e cinema brasileiro, particularmente com os textos-manifestos do cineasta Glauber Rocha. Este recorte tem sido desenvolvido no entremeio dos campos de interesse da discente, como direitos humanos, educação e estudos pós-coloniais, vinculados ao cinema e aos estudos de estética da recepção.
RESUMO: O presente trabalho realiza uma abordagem reflexiva do texto-manifesto “Eztetyka da Fome”, do cineasta brasileiro e baiano Glauber Rocha, com base nas teorias descoloniais e anti-coloniais. O texto em questão, datado de janeiro de 1965, é um dos escritos mais famosos do cineasta, e, como todo texto glauberiano, é eloquente e severo, sempre crítico; neste texto, escrito para um discurso em Gênova, na Itália, Glauber Rocha toma a desvalorização do cinema nacional para falar dos resquícios imperialistas que persistem em nossa cultura. Esta supervalorização da estética cinematográfica estrangeira viria apenas como um dos reflexos da dominação cultural que persiste, de acordo com o teórico Eduard Said, mesmo após a emancipação política. Esta dependência se realiza em níveis simbólicos e culturais, e é desvelada nas representações exibidas nos produtos culturais como literatura, televisão e cinema. Assim, as produções cinematográficas brasileiras, em sua maioria, seriam variáveis entre dois pólos principais: o da idealização do estrangeiro, mimetizando desde seus modos de produção até a estética fílmica; e o do exotismo, corrobora uma visão estrangeira sobre o Brasil a partir do reforço dos estereótipos. O cinema brasileiro, sempre num destes extremos, jamais se constituiria autêntico enquanto não se voltasse para sua própria situação de subalternidade. Deste modo, a fome surge como instrumento de subversão para que o cinema brasileiro desenvolva uma voz própria: Glauber sugere que o brasileiro se aproprie daquilo que se impõe como diferença entre a colônia e o império, e a tragédia da fome e da violência, cuja síntese é a imagem do sertão, vem dar forma a uma nova estética visual e narrativa que está presente no movimento cinemanovista. Os textos de Glauber muito nos dizem de seu modo de pensar a prática cinematográfica enquanto proposta de superação de uma colonialidade a partir de uma auto-narração que trabalha em favor da estruturação de uma identidade nacional, tomando o cinema como potência de embate político e apelo social. Para tanto, este trabalho traz, além de Eduard Said e Stuart Hall, estudiosos da obra textual e visual de Glauber Rocha e outras referências de estudos descoloniais que falem de cultura e território.



Claudio Maringelli (FCHS): Narrativa popular e reflexão política em Manituana, do coletivo Wu Ming”.
De nacionalidade italiana, moro em Faro desde janeiro de 2015. Em setembro do mesmo ano iniciei o Curso de Doutoramento em Literatura na Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade do Algarve.
Antes disso, em 2013 o Mestrado em Línguas e Literaturas Modernas na Universidade de Turim. A minha tese de mestrado é intitulada Decolonizzare l’avventura: Los viajes de Juan Sin Tierra, e analisa desde uma perspetiva pós-colonial o romance gráfico Los viajes de Juan Sin Tierra, de Javier de Isusi. Foi publicada na revista online da Universidade de Pádua Orillas.
Em 2014, frequentei um curso de especialização em Tradução Literária na Agenzia Formativa TuttoEuropa, em Turim. Atualmente sou tradutor profissional (de português, espanhol e inglês ao italiano) e escrevo artigos sobre banda desenhada no site italiano Fumettologica.it.
RESUMO: Partindo duma análise do projeto artístico do coletivo italiano denominado Wu Ming, o meu contributo visa analisar o romance Manituana, de 2007, em que é narrada a Guerra da Independência dos Estados Unidos desde o ponto de vista do povo Mohawk, que combateu ao lado dos lealistas ingleses contra os independentistas.
Os Wu Ming têm publicado vários romances históricos nos últimos vinte anos (Q, 1999; Manituana; Altai, 2009; e L’armata dei sonnambuli, 2014, além de outras obras publicadas como autores individuais) e propõem um projeto artístico e político de crítica ao sistema capitalista, que tem como principal meio de expressão a narrativa histórica, em vários níveis e com várias formas de comunicação, entre as quais um site muito ativo, wumingfoundation.com.
Neste contributo tenciono, mais especificadamente, pôr em luz a presença na obra de aspetos típicos do género aventuroso e da narrativa popular, nomeadamente: caraterísticas épicas, personagens com que os leitores podem facilmente identificar-se, técnicas narrativas tomadas do cinema de aventura e dos videojogos, e um nível relativamente baixo de inferência exigida a quem lê. Estes aspetos, porém, convivem com outros mais experimentais e complexos, quer a um nível narrativo quer a um nível de implicações éticas nas escolhas das personagens.
Esta dinâmica é identificada por Wu Ming 1 (um dos membros do coletivo) como uma caraterística de várias obras da narrativa italiana contemporânea: “I romanzi di cui sto parlando hanno (o almeno cercano) un'efficacia di primo acchito, sono leggibili e godibili anche senza decrittarne ogni aspetto […] La sperimentazione avviene nel popular” (Wu Ming 1, New Italian Epic. Letteratura, sguardi obliqui, ritorni al futuro, 2009). O que tenciono mostrar é como estas caraterísticas aparentemente opostas sejam, na realidade, coerentes a uma reflexão política, que em Manituana é relativa ao hibridismo (linguístico e cultural) e ao avance do capitalismo nos primeiros anos da história dos Estados Unidos. Esta reflexão política liga-se diretamente ao projeto de intervenção na política e na cultura contemporânea do coletivo Wu Ming.


João Minhoto Marques (FCHS/CIAC): “Escrever o tempo, construir a história — estratégias discursivas em Os Memoráveis, de Lídia Jorge”.

15:45: Pausa para café

16:00-17:10 Mesa 7 (moderação de Filipa Cerol)
Jusciele Conceição Almeida de Oliveira (CIAC): “De “Guiné dita portuguesa” à República da Guiné-Bissau: história e cinema nas representações cinematográficas no filme Mortu nega de Flora Gomes.
Possui graduação em Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia (2006). Especialização em Metodologia do Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Docência do Ensino Superior (2010). Mestre em Literatura e Cultura, pela Universidade Federal da Bahia (2013), com a dissertação sob o título "Tempos de Paz e Guerra: dilemas da contemporaneidade no filme Nha fala de Flora Gomes". Atualmente, é doutoranda pelo Centro de Investigação em Artes e Comunicação da Universidade do Algarve CIAC/Ualg, em Portugal sob orientação da Profa Dra Mirian Tavares, com bolsa da CAPES Doutorado Pleno no Exterior, investigando cinema guineense e africano, especificamente o cineasta Flora Gomes. Tem experiência na área de Letras e Cultura, com ênfase em Literatura e Cinema Africano de Língua Portuguesa.
RESUMO: As relações entre Portugal e o território chamado atualmente de Guiné-Bissau datam-se desde do século XV, com a chegada de Diogo Gomes na costa africana, todavia essas relações territoriais, políticas e culturais intensificam-se a partir de 1879, quando a Guiné-Bissau deixa de ser uma colônia da colônia, isto é, deixa de ser administrada por Cabo Verde. Mas, as relações entre Portugal e Guiné-Bissau tornam-se concretas e diretas, depois de 1884-1885, após a Conferência de Berlim, na qual delimitam-se as fronteiras físicas do continente Africano, como também as fronteiras físicas da Guiné-Bissau, que no período chamava-se Guiné Portuguesa, para diferenciar da Guiné Espanhola e da Guiné Francesa. Em 1963, depois de um longo processo de tentativa de descolonização entre a Guiné e Portugal, deflagra-se a guerra de independência contra o colonialismo português, que só terá fim em 1974, como o 25 de abril em Portugal. Nesse sentido, a história de Portugal e da Guiné-Bissau cruzam, por isto nesse texto, tratar-se-á das questões e relações histórias, culturais e memorialísticas, a partir da obra cinematografia do cineasta guineense Flora Gomes, filme Morto Nega (ficção/1988).

João Almeida Sobrinho (CEAUP-Universidade do Porto): “Comunidade Quilombola de Conceição das Crioulas e o audiovisual como auto-registro”.
Licenciado em História, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1997-2002).
Bacharel em História, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2002-2003).
Bacharel em Comunicação Social, pela UFRGS. (não concluído).
Doutorando em Estudos Africanos, pela Universidade do Porto, Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, Faculdade de Economia, Faculdade de Letras e Centro de Estudos Africanos. (2009-atual).

RESUMO: O presente trabalho apresenta alguns resultados do projeto de investigação que tem por objetivo realizar a análise dos processos educativos em São Tomé e Príncipe e na Comunidade Quilombola de Conceição das Crioulas em Pernambuco – Brasil. Aqui, apresento a dimensão que diz respeito à produção audiovisual da Comunidade Quilombola de Conceição das Crioulas e, particularmente, a produtora Crioulas Vídeo, que faz parte da mesma. Esta produção é também a luta pela posse do território em que está inserida e o fortalecimento da sua identidade como afro-descendente.
Esta dimensão veio fortalecer, não só a relação entre a ferramenta audiovisual e o autorreconhecimento como quilombola, mas também, de outras comunidades quilombolas da região através da promoção de oficinas de produção audivisual Tankalé (“contar para todo mundo” em yorubá-nagô) em outros quilombos da região. Nesta apresentação foram selecionados vídeos-documentários a partir das actividades de campo que realizei nesta comunidade, em três categorias: a) produção externa; b) produção quilombola e, c) Projecto Tankalé.
Nas categorias: a) realização externa – Visita ao Quilombo, Direção: Dácio Bicudo; b) realização Crioulas Vídeo e/ou em cooperação com o movimento intercultural identidades – Conceição das Crioulas; História da Escola Professor José Mendes; Hora de Crescer (juventude e identidade étnica); Artesanato – Reforço da Identidade Quilombola; e, c) Projeto Tankalé: Formação para o Auto-registro Audiovisual Quilombola – Comunidades Quilombolas de Livramento; Comunidades Quilombolas de Contendas e Santana e; Território Quilombola Águas do Velho Chico. Estes documentários abordam dimensões que estão unidas na vida cotidiana dos quilombolas.
O presente estudo revelou a consciência colectiva latente no que diz respeito à identidade quilombola que estava em alguns aspectos ofuscada pela invisibilidade. A partir do registro audiovisual esta invisibilidade tornou-se visível e passou a servir para fortalecer a causa quilombola, estreitar os laços entre as diferentes comunidades e reconhecer a autonomia destas para que possam contar as suas próprias narrativas.

Paulo Nóbrega Serra (Clepul): “Visões do real histórico em Lillias Fraser, de Hélia Correia”.
RESUMO: Nesta comunicação reflecte-se sobre a importância do realismo mágico como uma importante renovação da ficção. O realismo mágico é definido em termos da intervenção do maravilhoso numa narrativa de moldes realistas e contribuiu inclusivamente para uma redefinição do romance histórico, como é o caso da obra Lillias Fraser, de Hélia Correia.
Não deixa de ser sintomático o ressurgimento do romance histórico enquanto género literário em voga mas que, em autores como José Saramago e Hélia Correia, surgirá aliado ao maravilhoso na narração de acontecimentos históricos do passado nacional. Ao contrário do que acontecia com o fantástico que, ao imiscuir-se no real desestrutura a moldura das conveniências e asserções sociais e ontológicas do ser humano, o maravilhoso auxilia assim a compreensão das lacunas existentes nas versões oficiais.
Em Lillias Fraser, a voz narratorial parece confundir-se com a do autor, e recria um passado histórico a partir do presente, recriando ou reconstituindo o passado numa narrativa que se assume como uma efabulação, onde decorrem ainda incursões do mágico. O próprio passado que se procura resgatar é imbuído de sobrenaturalidade pois é assumido como mágico, exercendo o fascínio próprio de tudo o que é estrangeiro à época em que habitamos. A ocorrência do maravilhoso não provoca uma fractura ou disrupção no real mas enriquece o quotidiano, ao contrário do fantástico que colocava em causa as leis do mundo natural. Acresce ainda que essa aura de magia pretende retratar uma mentalidade de época que, in extremis, acreditava em superstições e crendices que hoje se ultrapassaram (ou talvez não, mas só em parte). No realismo mágico as leis do mundo real são flectidas, em que o sobrenatural se configura como uma estratégia que intenta contestar a ordem socialmente imposta, a autoridade política e os regimes totalitários.
A nossa análise pretende objetivar como se constrói este novo romance histórico, mediante a consideração de diversos aspectos textuais: indeterminação do tempo e do espaço, intervenção do maravilhoso ou dons sobrenaturais conferidos à personagem central. Entra-se assim no domínio da Metaficção historiográfica: revisita-se o passado; desconstroem-se se relatos oficiais; nega-se uma visão linear do tempo; questiona-se a História e o seu discurso oficial enquanto visão imposta por uma ideologia política e por um regime político. Reformula-se deste modo o padrão tradicional do romance histórico tradicional do século XIX. A problematização do conhecimento da História prende-se com a literatura pós-revolucionária, visando a subversão da verdade de uma História oficial pouco credível. Da mesma forma que, na descrição referencial, o verosímil é contraposto por uma outra ordem das coisas através da irrupção do maravilhoso, a referencialidade histórica, presente em várias ficções do realismo mágico, é feita mediante uma certa manipulação do referente histórico. O que seria um romance histórico convencional – como o próprio título indica –, acaba por apontar para uma reescrita da história através da intromissão da dimensão mágica, onde o outro (os esquecidos pela História oficial) ganha voz.
A autora Hélia Correia proferiu mesmo em entrevista não ter feito grande pesquisa histórica para a criação do seu romance Lillias Fraser. Ainda que Hélia Correia alegue não ser capaz de retratar o real histórico com precisão, instilando no leitor o verdadeiro espírito de época, julga-se que, pelo contrário, a evocação do real é assustadoramente realista, ainda que, curiosamente, seja feita de forma impressionista, lembrando certos quadros.

17:15 | Comunicação por convite: (apresentação de Sara Fernandez)
Petar Petrov (Clepul): "Literatura e Cinema: Diálogos Possíveis"
Aposentado com a categoria de Professor Associado com Agregação da Universidade do Algarve, onde leccionou as disciplinas de Literatura Portuguesa, Literaturas Estrangeiras de Língua Portuguesa (Brasileira e Africanas) e Literatura Comparada. Presentemente é co-coordenador da linha 5 do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias (CLEPUL) da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Publicou os seguintes livros: O Realismo na Ficção de José Cardoso Pires e de Rubem Fonseca, Lisboa, Difel, 2000, que ganhou o Prémio Revelação da Associação Portuguesa de Escritores, Aspectos de Literatura Brasileira. Estudos e Antologia e Comparatismo e Literaturas de Língua Portuguesa, Sófia, Five Plus, 2006 e 2007, Ficção em Língua Portuguesa. Ensaios, Lisboa, Roma Editora, 2010. Organizou também os volumes O Romance Português Pós-25 de Abril, Meridianos Lusófonos e O Conto Português Pós-25 de Abril, Roma Editora, 2005, 2008 e 2012, Lugares da Lusofonia, Lisboa, Colibri, 2010, A Primazia do Texto, Lisboa, Esfera do Caos, 2011, Avanços em…, Santiago de Compostela, Através Editora, 2012 e As Vozes da Balada, Lisboa, CLEPUL, 2012 (e-book).


18:00| Sessão de encerramento
18:30| Porto de honra



Uma organização do CIAC e do CLEPUL com o apoio da FCHS/Universidade do Algarve